Uma Epígrafe



"...Quanto à poesia, parece condenada a dizer apenas aqueles resíduos de paisagem, de memória e de sonho que a indústria cultural ainda não conseguiu manipular para vender."...[Alfredo Bosi, in O Ser e o Tempo da Poesia, p. 133]

sábado, dezembro 13, 2008

Mátria Nº 2, ou Dionisius Portugalliae Rex




















É Kujawski, quem afirma, in Fernando Pessoa, o Outro, que "o dizer português é sempre vizinho da efusão lírica, pronto a vibrar em toda a escala de íntimas lamentações e exultações, de secretos cuidados e enternecimentos próprios às fundas confidências. Daí as qualidades da prosódia da língua portuguesa -- alongada e ondulante; ondulações que se perdem ao longe (...)"
Regressemos a esse longínquo pretérito, acompanhando um dançar dionisíaco, através do léxico arcaico do cronista-narrador Fernão Lopes, que transcrevi da obra citada acima, p. 25. Deitem os vossos olhos sobre esses vetustos vocábulos, soprem-lhes os fonemas e deixem emergir do inconsciente, os albores do efusivo lirismo dessa Língua Portuguesa:

Viinha elRei em batees Dalmada pera Lixboa, e saiam-no a reçeber os cidadãaos e todollos dos mesteres com danças e trebelhos, segumdo estomçe husavom; e el saia dos batees, e metiasse na dança com elles, e assi hia ataa o paaço. Paraae mentes se foi boom sabor: jazia elRei em Lixboa huuma noite na cama, e non lhe viinha sono pera dormir e fez levamtar os moços e quamtos dormiam no paaço, e mandou chamar Joham Mateus, e Lourenço Pallos que trouvesem as trombas de prata, e fez açemder tochas, e meteosse pela villa em damça com os outros; as gentes que dormiam, sahiam aas janelas, veer que festa era aquella, ou porque se fazia; e quando virom daquella guisa elRei tomarom prazer de o ver assi ledo; e amdou elRei assi gram parte da noite, e tornousse ao paaço em damça; e pedio vinho e fruita, e lançouse a dormir.
(Crónica de D. Pedro I, Barcelos - 1932, pp 42-43, apud Fernando Pessoa, o Outro, G. M. Kujawski, pp. 25,26)


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Ilustração:
Casa de Locos - Goya
(clique na imagem e irá até o site de origem)
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5 comentários:

Paula Barros disse...

Oi.

Estou por aqui lendo. Acomapanhando.

abraços e bom final de semana.

Sueli Maia (Mai) disse...

Oi, Eurico.
Eu fico é rica em meio a tanta emoção e cultura, servida em doses fartas, de abundantes palavras.
De novo, belo texto.
Outra aula.
Isto é arte, pura, das melhores!

Sueli Maia (Mai) disse...

Oi, amigo-Eurico.
Aqui neste espaço, tudo é intenso.
A emoção transborda, as palavras são abundantes em significado.
Isto é arte, pura, das melhores!

Novamente saio abastecida de cultura.

carinho, sempre.

Dauri Batisti disse...

Nossa! Como deliciosamente somos mutantes. Como emergimos do caldo de sons permanentemente com novas improvisações das velhas notas musicais. Como somos a cada dia outro e ainda os mesmos, sempre.

Só o Eurico para nos oferecer isso.

Um abraço.

FERNANDINHA & POEMAS disse...

Olá querido Eurico, gostei muito do texto... Bom fim de semana... Beijinhos de carinho e ternura,
Fernandinha