Uma Epígrafe



"...Quanto à poesia, parece condenada a dizer apenas aqueles resíduos de paisagem, de memória e de sonho que a indústria cultural ainda não conseguiu manipular para vender."...[Alfredo Bosi, in O Ser e o Tempo da Poesia, p. 133]

quarta-feira, maio 30, 2007

ALCÁCER-QUIBIR revisitada


Uma monocromia armorial
dedicada a Dom Ariano Villar Suassuna







Vermelhidões no poente,
céu sangüíneo, incandescente.
Da porfia oiço o alarido:

Rezas,
.......rajadas,
...............rugidos.

sonho um sonho mal dormido:
de morte, em luta renhida,
foi Dom Sebastião malferido?

Feito de sonho é o que vejo:
estranhos carros de fogo
cruzam os céus sertanejos.
Ungem de luz a caatinga
Essas flamejantes bigas.
Vermelhidões no poente:
Seriam sarças ardentes?

Nos sertões os céus tão rubros:
sangue na chã de Canudos?

Ao longe oiço estampidos:
raios,
......trovões
............. e gemidos...

Vermelhidões no poente
rumores de gado e gente
clamor do sangue inocente:
hereges sangrando os crentes?

sonho um sonho mal dormido:
de morte,( ouço o rugido)
foi o Prinspe atingido?...

Vermelhidões no poente:
crepúsculo enceguecente,
E em estranho carro de fogo
Dom Sebastião soerguido...


Eurico

domingo, maio 27, 2007

Óxente, que blog arretado!


No pé da parede




Se vosmecê tem aquele orgulho danado pelas coisas do nordeste, acesse o blog arretado do poeta Jorge Filó.
Clique:
no pé da parede

Eu recomendo.
Eurico
27.05.07

sexta-feira, maio 25, 2007

Emoção proustiana



Eurico no Alto da Sé - Olinda
ao fundo a Bertioga e o casario mais que centenário


A mesma impressão que eu teria ao ouvir Beatles, Creedence, Renato e seus Blue Caps, ou antigas canções de Elton John, creio que senti ao achar ontem, no orkut, um velho amigo de infância. Veio à lembrança o tempo bom do Ginásio Pernambucano: as peladas na quadra, as descobertas no museu de história natural; tempo de amizade sincera, coisa rara hoje em dia.
Achei o Roberto Portella, um jovem senhor, um ano mais novo do que eu, que insistiu no seu sonho de desenhista, vindo de lá dos idos de 1968/69, quando nos mostrava seus interessantes desenhos em sala de aula. Hoje um imagemaker, webdesigner, sei lá eu, mas tudo dentro da área das artes plásticas por onde ele, decerto, enveredou.
Aquela turma do GP foi das melhores coisas da minha vida. Apesar do pânico que eram as aulas do Cláudio Estelita, que nos obrigou a fazer todos os exercícios da coleção Matemática Moderna, do Marcius Brandão, tínhamos ali muitos predestinados: o Jader, que hoje é médico; Zé Fernandes, físico, se não me engano; o Carlos Alberto, do nosso tempo, que morreu jogando pelo Sport e, o nosso Roberto Portella, que eu tinha certeza que seria da área de arquitetura, designer ou artes plásticas.
Registro aqui minha alegria de ter visto o belo trabalho feito pelo Portella e que está aberto ao público aqui, nessa rede, para deleite dos navegadores.
Acessem, pois:

http://www.robertoportella.com.br


E vejam as obras de arte desse exímio artista-digital, ou imagemaker, como usa dizer.
Parabéns, amigo.

Eurico
26.maio.2007

P.S.: depois dessa data, além do Portella, encontrei o Raul Manhães, médico e professor da UFPE, Ivan e Ivson, os dois irmãos que moravam em Areias, o Jader de Alemão Cysneiros, regente da banda, que, hoje, mora na Europa. Tive notícias do Rudex, mas falta reencontrar o Luiz Carlos de Souza, Caveirinha, o fera em matemática, que está morando em João Pessoa, segundo o Ivan. Ah, sempre vejo o Edvaldo Valentin, advogado, que já me defendeu em causa trabalhista contra o Bandepe. Ganhamos.
As notas triste são o falecimento do Jader Lucena, médico e do Irandé. Que Deus os tenha!

quinta-feira, maio 24, 2007

ÍNDIOS



“...nos deram espelhos, vimos um mundo doente...”
Renato Russo



Certo dia descobrimos uns galegos
Com seu deus crucificado
e, incautos, nos entregamos, cordeiros,
ao holocausto...

Descobrimos a Europa
Com os seus princípios...de bosta,
seus missais e arcabuzes,
a sua ciência morta,
E com as doenças de um mundo
ranzinza e antivital.
Nesse dia tão medonho
nos tornamos Portugal.

Contaram-nos do amor desse deus manso e pacífico,
por seus tataravós assassinado,
E, poluindo nossas almas inocentes,
nos vestiram com esse manto fictício,
e esses valores nauseabundos do ocidente.


Quem sabe, Nietzche, salve-nos, quem sabe,
pela transvaloração dessa cultura.
E que a Tribo também morra ensandecida
nesse velho Novo Mundo infectado pela usura,
com rosários de prata sobre o peito.
e pedaços de oiro em nossos dentes.

Mas morramos numa festa do Quarup
sem pecado, sem medo e sem mentiras,
celebrando a floresta ou a que nos resta
alegremente livres...
sim, felizes!


Eurico 2006

quarta-feira, maio 23, 2007

Ouvir galáxias? Perdi o senso!


Não gosto dele, do Olavo. Não é nada contra a forma fixa e metrificada dos versos parnasianos. O problema é outro: ele foi o a autor da lei que tornou obrigatório o serviço militar no Brasil. Servi no 14º RI e não gostei. rsrsrs
Mas, como bom Esferista, farei como o mestre Dom Eugenio Paxelly, o pai do Esferismo, nos orientava, e buscarei ver o lado bom desse poeta/deputado. Aliás, depois que o Belchior musicou o "ora (direis) ouvir estrelas! Certo perdeste o senso!" que tantas vezes ouvi, nas recorrentes e malfadadas ocasiões das perdas amorosas juvenis, fui levado a ler os sonetos que abaixo transcrevo, pirateado da net. Cito a fonte, é claro!
E vamos ao Olavo!

P.S.: a favor do Olavo temos os bons poemas neo-parnasianos do Bandeira e do Vinicius, embora eu prefira, questão de gosto, o Drummond e o João Cabral.



VIA-LÁCTEA
Olavo Bilac

(fragmento)



XIII

“Ora (direis) ouvir estrelas! Certo
Perdeste o senso!” E eu vos direi, no entanto,
Que, para ouvi-las, muita vez desperto
E abro as janelas, pálido de espanto...

E conversamos toda a noite, enquanto
A via-láctea, como um pálio aberto,
Cintila. E, ao vir do sol, saudoso e em pranto,
Inda as procuro pelo céu deserto.

Direis agora: “Tresloucado amigo!
Que conversas com elas? Que sentido
Tem o que dizem, quando estão contigo?”

E eu vos direi:”Amai para entende-las!
Pois só quem ama pode ter ouvido
Capaz de ouvir e de entender estrelas”.




XXVII

Ontem – néscio que fui! - maliciosa
Disse uma estrela, a rir, na imensa altura:
“Amigo! uma de nós, a mais formosa
De todas nós, a mais formosa e pura,

Faz anos amanhã... Vamos! procura
A rima de ouro mais brilhante, a rosa
De cor mais viva e de maior frescura!”
E eu murmurei comigo: “Mentirosa!”

E segui. Pois tão cego fui por elas,
Que, enfim, curado pelos seus enganos,
Já não creio em nenhuma das estrelas...

E – mal de mim! – eis-me, a teus pés, em pranto...
Olha: se nada fiz para os teus anos,
Culpa as tuas irmãs que enganam tanto!


XXXV

Pouco me pesa que mofeis sorrindo
Destes versos puríssimos e santos:
Porque, nisto de amor e íntimos prantos,
Dos louvores do público prescindo.

Homens de bronze! um haverá, de tantos,
(Talvez um só) que, esta paixão sentindo,
Aqui demore o olhar, vendo e medindo
O alcance e o sentimento destes cantos.

Será esse o meu público. E, decerto,
Esse dirá: “Pode viver tranqüilo
Quem assim ama, sendo assim amado!”

E, trêmulo, de lágrimas coberto,
Há de estimar quem lhe contou aquilo
Que nunca ouviu com tanto ardor contado.


Fonte:
BILAC, Olavo. Antologia : Poesias. São Paulo : Martin Claret, 2002. p. 37-55 : Via-Láctea. (Coleção a obra-prima de cada autor).

Texto proveniente de:
A Biblioteca Virtual do Estudante Brasileiro
A Escola do Futuro da Universidade de São Paulo
Permitido o uso apenas para fins educacionais.

Texto-base digitalizado por:
Anamaria Grunfeld Villaça Koch – São Paulo/SP

Este material pode ser redistribuído livremente, desde que não seja alterado, e que as informações acima sejam mantidas. Para maiores informações, escreva para .

Estamos em busca de patrocinadores e voluntários para nos ajudar a manter este projeto. Se você quer ajudar de alguma forma, mande um e-mail para e saiba como isso é possível.


Eurico
23 de maio de 2007

sábado, maio 19, 2007

Brasa e mel










A criança vê fundo e antes
um mundo feito em relações desconcertantes.
Faz a eternidade,
agarra o instante,
consegue ver até, olhos ausentes,
o modo sutil,
em que do sono da brasa, latente,
brota o mel...

A criança é mãe do sonho,
sabe os secretos sentidos,
tem a ciência da fauna
e a presciência da flora,
conhece o segredo antigo
que da pequena semente
faz surgir o baobá.

Os gregos chamavam physis
e os romanos, natura;
e a criança, sem dar nomes,
brinca com as coisas futuras,
desmonta o reino dos homens
governa o reino do céu,
paira com Deus sobre as águas,
toma banho de chapéu.

A criança doma o medo,
rasga o finíssimo véu
sobre o sentido da Vida:
Só ela sabe o segredo
o indizível segredo,
com que a brasa gera o mel.


06.07.2000
de uma conversa de ateliê

segunda-feira, maio 14, 2007

O Visitador Romano



A liberdade de pensar, a liberdade de culto, a liberdade, enfim, (o próprio livre arbítrio, que já deve estar gravado no inconsciente coletivo) estremeceu por esses dias, com a passagem, ainda que breve, do Visitador Romano por essa terra brasilis.

Celebremos sua partida e demos graças a Deus por lhe ter tirado os poderes que há séculos atrás nos afligiram.
Que vá em paz, de volta ao Vaticano, o Sumo Visitador, ostentando sua pompa, hoje inócua - gratia Dio! - e sem a tenebrosa força com que supliciou tantos irmãos do livre-pensar.

Saúde e fraternidade a todos!

P. S.: como não é nosso desejo ferir os muitos amigos e irmãos católicos que temos, declaramos que não há aqui nenhum anti-clericalismo. Sou fã de Dom Hélder, Pe. Reginaldo Veloso, Irmã Dulce e Leonardo Boff. Também venero Maria e amo Jesus. Sei, no entanto, que eles jamais aprovariam o Santo Ofício, nem silenciariam a Teologia da Libertação, por exemplo. O que temo é a hipocrisia e a tentativa de desfazer o estado laico e plural, que conseguimos a preço de tantas mortes e privações. É isso!