Uma Epígrafe



"...Quanto à poesia, parece condenada a dizer apenas aqueles resíduos de paisagem, de memória e de sonho que a indústria cultural ainda não conseguiu manipular para vender."...[Alfredo Bosi, in O Ser e o Tempo da Poesia, p. 133]

sábado, dezembro 04, 2010

DAS DORES (releitura em Eleanor Rigby)




















...................................a Lennon e McCartney



Das Dores era uma mulher solitária.
Habitava uma casinha de taipa no sertão do Exu,
E criava muitas cabras, todas pretas, soltas pela caatinga.

Só costumava ir à missa
nos dias em que havia casamento,
a ver se conseguia pegar o buquê.
Nesses dias o velho padre lhe falava da salvação da alma.

Flores na mão, seguia rindo,
pela estrada empoeirada.
Ria muito, aquela mulher, casta e solitária.
Ria, não se sabe de quê.
As cabras a seguiam, em cortejo, comendo as flores murchas.

Quando morreu não havia ninguém no enterro.
As cabras não vieram: não houve flores.
Somente o vulto de uma cadela, preta e triste, rondava o campo santo.

O velho pároco recitou um trecho do Sermão de Santo Antonio aos Peixes, à beira da cova rasa.
“Vos estis sal terrae...”
Um inútil sermão para uma alma extinta e breve.

Que o sal dessa terra seca lhe seja leve...




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Eurico uma releitura livre e
ditada pela emoção que sinto ao ouvir
Eleanor Rigby.




AH, LOOK AT ALL THE LONELY PEOPLE!
AH, LOOK AT ALL THE LONELY PEOPLE!

ELEANOR RIGBY PICKS UP THE RICE IN THE CHURCH
WHERE A WEDDING HAS BEEN
LIVES IN A DREAM
WAITS AT THE WINDOW
WEARING A FACE THAT SHE KEEPS IN A JAR BY THE DOOR
WHO IS IT FOR?

ALL THE LONELY PEOPLE
WHERE DO THEY ALL COME FROM?
ALL THE LONELY PEOPLE
WHERE DO THEY ALL BELONG?

FATHER MCKENZIE, WRITING THE WORDS OF A SERMON
THAT NO ONE WILL HEAR
NO ONE COMES NEAR
LOOK AT HIM WORKING, DARNING HIS SOCKS IN THE NIGHT
WHEN THERE´S NOBODY THERE
WHAT DOES HE CARE?

ALL THE LONELY PEOPLE...

ELEANOR RIGBY DIED IN THE CHURCH
AND WAS BURIED ALONG WITH HER NAME
NOBODY CAME
FATHER MCKENZIE WIPING THE DIRT FROM HIS HANDS
AS HE WALKS FROM THE GRAVE
NO ONE WAS SAVED

ALL THE LONELY PEOPLE...

AH, LOOK AT ALL THE LONELY PEOPLE!...
Mormente, ao ler a versão da Cássia Eller.
Ohw, olhe pra todas as pessoas solitárias...
Ohw, olhe pra todas as pessoas solitárias...

Eleanor rigby recolhe arroz na igreja
Onde houve um casamento
Vive num sonho
Espera na janela
Ostentando um rosto que ela deixa numa jarra ao lado da porta
Para quem é isso?

Todas as pessoas solitárias...
De onde elas vem?
Todas as pessoas solitárias...
A onde elas pertencem?

Padre Mckenzie escrevendo um sermão
Que ninguém vai ouvir
Ninguém se aproxima
Olhe pra ele trabalhando, costurando suas meias à noite
Quando ninguém está lá
Pro quê ele se importa?

Eleanor rigby morreu na igreja
E foi enterrada junto com seu nome
Ninguém veio
Padre Mckenzie limpando a sujeira das mãos
Enquanto caminha da sepultura
Ninguém foi salvo


Moral do poeminha:há solidão em qualquer lugar,
em Liverpool
ou no Exu.

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Fonte da imagem:
Vidas Secas


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6 comentários:

Paula Barros disse...

Eurico, realmente existe solidão neste vasto mundo.

A imagem ficou excelente com o texto.

abraço

Zélia Guardiano disse...

Lindo demais, Eurico!
A releitura, a dedicatória, a música, uma das minhas favoritas...
Postagem que me levou às lágrimas.
Abraço apertado, amigo.

Sueli Maia (Mai) disse...

Estamos em muita sintonia, Eurico, eu adoro esta música, e ao mesmo tempo ela me mata...
Este teu texto é uma pedrada em beleza e real morbidez desses tempos.

abraços e abraços desta tua amiga de infância

Sueli Maia (Mai) disse...

Ah! E editei esta música em meu post de hoje.
Caiu como uma luva, esta trilha das gentes prementes de amor e transbordantes em solidão.

beijos

Unknown disse...

como se costuma dizer por aqui em tom de entusiasmo: de torar. excepcionalmente criativa a tua versão, realmente mágica


abração

lula eurico disse...

É por isso que os Beatles ainda são famosos. Com uma letra dessas em um rock sinfonico... é mesmo

de torar, né Assis (tenho vontade de conhecer tua terra), a terra de um poeta prenhe de imagens, mas que guarda as expressões de sua gente: é de torar!;

uma pedrada, né Mai;

tb chorei, Zélia, qdo fiz a postagem original;

Paulinha, as imagens são o teu forte, mas continua a escrever. Tenho lido tuas coisas. Que belas elas são!