Uma Epígrafe
"...Quanto à poesia, parece condenada a dizer apenas aqueles resíduos de paisagem, de memória e de sonho que a indústria cultural ainda não conseguiu manipular para vender."...[Alfredo Bosi, in O Ser e o Tempo da Poesia, p. 133]
terça-feira, julho 19, 2011
ODE TRIVIAL
Talheres, s.d.
84 talheres de metais diversos e 2 caixas de papelão Hércules contendo 7 colheres cada uma; madeira, papelão, plástico, pregos, fita de tecido e fórmica
137 x 47 x 9,5 cm
Museu Bispo do Rosario (Rio de Janeiro, RJ)
As coisas.
Nuas
em sua crua mesmidade.
As coisas.
Rasas
vazam dos olhos
vozes ab-surdas
coisas miúdas
feixes de chistes
pendulares
cachos de coisas
falhas de estanho
estranhos kits
Esses retalhos
de atos falhos
de coisas ôcas
e outras poucas
coisas em pencas
vãs e diretas
retas, ovais
as coisas tôscas
gastas, iguais
As coisas.
Mudas
em elas mesmas
puras, desnudas
e nada mais.
Canecas, s.d.
32 canecas de alumínio, madeira, papelão e fios de arame
110 x 48 x 10 cm
Museu Bispo do Rosario (Rio de Janeiro, RJ)
Fonte das imagens:
MUSEU BISPO DO ROSÁRIO
Marcadores:
artefato verbal,
experimento,
homenagem,
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10 comentários:
Maravilha, Eurico!
Você é realmente fenomenal! Cultura e lirismo juntos. Demais!
Beijos
Mirze
....nossa q coisa mais tocante!
saio daqui com menos peso na memoria. obrigada!
beijao
Estive aqui pela manhã... e estou pra te dizer que essa Ode Trival percorreu mais que cantos comuns - fez um "estrago" hoje - o dia todo. E imagino que será assim ainda por um tempo.
É o poder deste teu poema com a obra do Bispo do Rosário (que há muito me encanta e sensibiliza). É como se tudo fizesse um barulho de suave a estridente, de pleno a ôco, nestas várias imagens que propões.
Uma experiência muito bonita e não menos forte. Eu só posso agradecer!
Amiga,
relendo O Mercado, descobri que ali já havia o Bispo do Rosário.
Creio que estamos imersos no mesmo mundo imaginário. srsrsrs
Grato pelas tuas leituras.
Sempre me motivas ao trabalho.
Abraço fra/terno.
Belíssimo! Mas o que a poesia pode produzir de pasmo diante dessa mesmidade não está no gibi!
Como o homem dota tudo de simbolismo, eu me pergunto: há a coisa ela mesma? Esse simbolismo é que possibilita os deslocamentos que produzem arte. As funções parecem não conseguir manter as coisas em seus devidos lugares; uma colher num prato de sopa é a colher ela mesma, talvez; mas uma colher dentro de um livro já é outra coisa, afora ainda ser em parte uma colher.
Não consigo ver essas assemblagens, com suas enumerações, sem pensar que elas possam representar os usuários "fictícios" desses objetos. Como um álbum de fotografias de seres já passados, como lápides num cemitério, elas parecem impregnadas de memórias pessoais que permanecem latentes num coletivo.
Parabéns, Eurico! Grande abraço.
Marcantonio,
essa discussão se existe a coisa em si mesma recebeu um rótulo: realismo.
Concordo contigo, Poeta, derrama-se sobre a coisa seu entorno, sua circum-stantia, seu presente histórico e intra-histórico, sua biografia, sua função dentro da vida, enfim.
Não há o eu sem as cosas, nem as coisas sem o eu. Os dois coabitam em amistoso "contubérnio", como diria um outro...rsrsrs
Fico agradecido com tuas palavras, aqui nesse laboratório chamado Eu-lírico. Elas me animam e me instigam ao trabalho.
Grato.
(li em tua entrevista no Roxo, que és um autodidata. Também sou. Bibliodidata, eu diria. Estamos no mesmo mar, dando braçadas semelhantes, diante da imensa massa aquática de informações... Naveguemos!)
Abç fraterno.
Abençoados os que possuem amigos, os que os têm sem pedir.
Porque amigo não se pede, não se compra, nem se vende.
Amigo a gente sente!
Benditos os que sofrem por amigos, os que falam com o olhar.
Porque amigo não se cala, não questiona, nem se rende.
Amigo a gente entende!
Benditos os que guardam amigos, os que entregam o ombro pra chorar.
Porque amigo sofre e chora.
Amigo não tem hora pra consolar!
Benditos sejam os amigos que acreditam na tua verdade ou te apontam a realidade.
Porque amigo é a direção.
Amigo é a base quando falta o chão!
Benditos sejam todos os amigos de raízes, verdadeiros.
Porque amigos são herdeiros da real sagacidade.
Ter amigos é a melhor cumplicidade!
Feliz dia do amigo!
Bjs.
Quem me dera ter a mesma capacidade de traduzir em palavras o que senti ao ler seus poemas, odes, poesias, que tem Marcantonio ou vc mesmo. Na verdade, "derrama-se sobre a coisa o seu entorno" foi a melhor descrição de realismo que já li.
De seu poema não sei falar como gostaria, mas garanto-lhe, eu o senti palavra por palavra.
Dar-me-ia a honra de ir conhecer meu blog?
Beijokas.
Seguindo...
Lua,
essa definição do realismo foi captada do pensamento do raciovitalista Ortega y Gasset, que tenho sempre à cabeceira, bibliodidata que sou... hehehe
Grato pela visita e um grande abraço.
Irei sim, ao teu blog, com muito prazer.
Vim pelo blog do Assis Freitas. Gostei daqui!
Abraço.
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