Uma Epígrafe



"...Quanto à poesia, parece condenada a dizer apenas aqueles resíduos de paisagem, de memória e de sonho que a indústria cultural ainda não conseguiu manipular para vender."...[Alfredo Bosi, in O Ser e o Tempo da Poesia, p. 133]

sexta-feira, maio 09, 2008

Tantãs


Dionisos é negro e dança em transe,
Vertiginosa dança com seus mitos.
Escuto o som distante:
Tum dee dee dum!
Maracatumbam tambores:
Tum dee dee dum, dee dee dum!
Vozes líquidas vazam dos casebres
onde se dança à transmutação.
Abro a janela,
instante numinoso,
júbilo de concelebração:
Tum dee dee dum a um Pã universal!
Sem guante a africana gesta e um falo
fecunda intensamente a natureza.
Regaço, cosmos, mãe, força telúrica:
Deus é um útero, um dentro, um aconchego.
E solto Dionisos dança negro,
abandonado à ondulação da vida,
vertiginosa dança com seus ritos:
Tum dee dee dum com alegria cósmica,
voz de tambores, noite suburbana.
Sambarrebatamento nos barracos
e percutidos gritos ao Infinito!
***
Eurico
Poema publicado originalmente
no zine Eu-lírico n.º 4, Ano 1995,
em Edição comemorativa dos 300 anos de Zumbi
Fonte da imagem:

16 comentários:

DiAfonso disse...

Eita lá, cumpadi! Acesso o seu blog ao mesmo tempo em que escuto "Epitáfio" e "Enquanto Houver Sol", dos Titãs... E uma simbiose estranha se instala: "Tantãs", "Titãs"... Bach ao fundo... Dionísios, Negro e solto, dança... gritos percuterm no infinito... Abração... és o cara dos signos significáveis e significantes... Saussure devia ter prestado atenção a você... kkkkkkkkkkkkkkk lá pelos idos de 1900... rsrs

DiAfonso disse...

Ou será que você é o Saussure reinventado? Tenho cá comigo que estas simbioses acontecem... Nunca significaria signos como vosmescês. Muitas vezes, sangro para dizer uma "ai" e você (sangra que eu sei... rsrs) diz de uma maneira menos hemorrágica: HEMOPOESIS ou HEMOPOÍESES!!! (quer latino, quer grego... universal... Lembra-se da unversalidade de que tanto falávamos no bar da
Algaroba?!?!

Abração, grande amigo, cumpadi, irmão mais velho!

Ilaine disse...

Tum dee dee dum!
Ao ler o poema pude sentir o ritmo do bailar de Dionisos em extremo júbilo.Tambores retumbam aos meus ouvidos e sinto a celebração de nossa herança cultural desenhada nesta cadência de palavras. Lindo, Eurico!

Loba disse...

caramba! como é que se pega uma aresta de um poema tão redondo?
penso no tambor e na perfeita sintonia de homem e sons. uma beleza negra que me faz lembrar as comemorações do 13 de maio de uma cidade mineira. o tributo à nossa africanidade.
seu poema é um tributo. uma homenagem das mais belas.
beijo

Beto Mathos disse...

Intenso.
Não existe melhor palavra para os poemas que têm o dom de nos transportar.

Luis Eustáquio Soares disse...

dionísio é negro e dança os ritmo da festa das cocatenações, floresta de símbolos, entre os raios das estrelas, se brilho, o o brilho dos olhos, no escuro, da pantera negra, uma constelação de encontros, de transes-de-semelhanças, entre tudo com tudo, a nos dizer que somos o mundo inteiro, e eis o começo de nossa infinita responsabilidade.
meu abraço,
luis e obrigado pela vistia sempre instigante.

Joice Worm disse...

Humm... Gostei da colocação das palavras, do nome do negro e ver mentalmente a dança vertiginosa. O barulho do tambor, deve ser coisa do meu passado espiritual. Tremo por dentro com os toques de tambores. E enquanto lia, me dei conta que saltava os sons do intrumento. Será que tenho algum trauma? Vá vê fui comida depois de cozida em um caldeirão de água quente ao som comemorativo dos tambores... (mas fora este particular, adorei o poema. Vou usar como Terapia).

Yara Souza disse...

Um poema negro
dança vertiginoso,
transmutado
em vozes líquidas.

O poema negro
é um deus
dançando no útero.

É um grito infinito,
um tum dee dee dum
no peito!

Unknown disse...

Eurico,graças a sua visita ao meu blog, chego aqui e me encanto com suas letras, com seu estilo substantivo de dizer poesia, ao som de seus tambores ( poema macro) rendo venias ao poeta.
Obrigada , e passe sempre pelo palavras do ventre.
Carinhosamente nanamerij

Dauri Batisti disse...

Cara amigo, somos muitos os amadores da poesia, mas você é um profissional. Você faz arte.

Canto da Boca disse...

Cá estou eu a espreitar seu espaço, tentar acompanhar seus passos, mas sempre respeitando os meu compassos - o que já está dito que respeito aos outros, dos outros...
Eu aqui cheia de limitações, sono e cansaço de uma mal dormida noite, me entrmeio no seu texto e capturei palavras, frases, verbos, que compõem, imagens, totens, sinais que transcendem e por isso mesmo reforçam a heterogeneidade tao aviltada nessa pós-modernidade:
Dionisos é negro - o que embriaga hoje já não é tão somente o vinho, além de tantas outras substancias alucinógenas, nada embriaga mais do que o poder, e o mundo anda impondo-se ao mundo...
A cultura "branca", alude aos mitos desde sempre uma superioridade ariana - tema batido e debatido, mas ainda premente na nossa sociedade tao hipócrita... Pensam que uma classificação étnica etermina o caráter.... Donde todos somos filhos e filhas da mãe áfrica (minha bênção!)...
Vertiginosa dança com seus mitos.
Escuto o som distante:
Tum dee dee dum!
Maracatumbam tambores: - Todos os sons também vieram da África...
Vozes líquidas vazam dos casebres - Tudo é moldável nesse momento, tudo tem a plasticidade da necessidade do imediato, não se fortalece nada, nem se consubstancia, porque tudo é feito para ser descartável, tudo é feito para ser efêmero, sobretudo as relaçoes humanas....
onde se dança à transmutação. - gente se cosificando e coisas se gentificando... E no final, o individualismo supera o coletivo e todos dançam... A dança das cadeiras, que sempre vai sobrar um? A transfiguração do humano - Mas aqui pedimos licença ao Lirinha e os meninos do Cordel e enfeitamo a minha dissecação com a musica deles: Transfiguração - a paixao é um mar... Parabólica... Dilatada... Estrada que dói... Encanto de flor... Labirinto... À espera de redes (pode ser a mundial de computadores, risos)... Parece toda raiz... Só raiz... Quando nao canta o trovao... Transfiguração!
Fico aqui no primeiro parágrafo, porque senao, "hoje é só amanhã"...
Obrigada pela visita e desconsidere meus ditirambos.
Isso é a liberdade da interpretaçao... Risos.
Abraço.
;)

Jacinta Dantas disse...

Eurico,
esse Tum dee dee dum ficou demarcando minha leitura ao seu Tantãs, como o pulsar do meu coração, agora em rito acelerado...
Beijos

Dora disse...

Na celebração de um universal(Pã), o negro Dionisos dança o ritual dos prazeres e dos louvores à fecundidade da mãe África, no frenesi das canções de inúmeras bocas...Nos tantãs dos tambores e maracatus, as vozes se elevam em uníssono e saúdam o Cosmos e as divindades.Assim se faz na África e fora de suas fronteiras, para onde os africanos carregam seus mitos e comemorações.
Poema sempre bem construído.
Beijo meu.
Dora

Dora disse...

Eu estou desolada, Eurico. Um comentário que fiz, pensado, carinhosamente lavrado...Onde foi parar? Eu o deixei aqui e ele se foi...
Fui reclamar lá no compadre Carlinhos, e, não sei se foi combinação de vocês...meu comentário-reclamação evaporou-se lá também!
Isto aqui é um teste...
Se vc ler é porque eu consegui, desta vez...
Vou aguardar...
Beijos.
Dora

Ilaine disse...

Eurico!

Vim aqui para ler tua poesia mais uma vez e para agradecer pela visita lá no baú. Deixei um comentário para você.

Enviei dois e-mails para você, Eurico. Espero que tenhas recebido.

Abraço

RENATA CORDEIRO disse...

Simplesmente lindo!
Visite meu blog:
wwwrenatacordeiro.blogspot.com/
não há ponto depois de www
Um abraço empático,
Renata