Uma Epígrafe
"...Quanto à poesia, parece condenada a dizer apenas aqueles resíduos de paisagem, de memória e de sonho que a indústria cultural ainda não conseguiu manipular para vender."...[Alfredo Bosi, in
O Ser e o Tempo da Poesia, p. 133]

Enterneço-me...
Esse é meu método fenomenológico de acercar-me à realidade.
Não busco saber o mundo, dom inacessível,
Contenta-me o afã da compreensão, e assim,
Intento aproximar-me de tudo e de mim,
pela ternura.
Pelo lirismo, eu diria, ingenuamente.
Esse é o portal de tudo.
Enterneço-me... e assim aprendo
a ver mais profundamente.
Exemplo disso são os colibris
que beijam flores em nosso quintal...
Eles decifram-me a minha mãe,
a enigmática guardiã de crotes e avencas...
Daqui, de dentro da ternura,
enfim, enxergo a rua
toda a rua, cinzenta e nua:
Não há mais verde na vizinhança.
Por isso a fauna miúda vem pra cá.
Lagartos, colibris, formigas.
(Ai, com que ternura tão antiga
minha mãe abriga
tudo isso aqui...)
E só agora,
nessa fenomenológica ternura, eu percebi.
Mãe, minha amiga!
Li teu enigma.
E esvoaço, enternecido.
Por um instante estou colibri...

Nuvens sobre a floresta...
Sombra com sombra a mais...
Minha tristeza é esta –
A das coisas reais.
A outra, a que pertence
Aos sonhos que perdi,
Nesta hora não me vence,
Se a há, não a há aqui.
Mas esta, a do arvoredo
Que o céu sem luz invade,
Faz-me receio e medo...
Quem foi minha saudade?
Fernando Pessoa
Fonte do texto: http://bloggloria1.blogs.sapo.pt/arquivo/2005_07.html
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ou
Pequena Lição de Poíesis
A prosa, por sua natureza, pode ser poética
porque sempre traz, dentro de si, hermética,
uma pequena rosa.
Em sendo assim,
o que se chama simplesmente prosa
é a tentativa frustrada de ocultar
no discurso (coisa odiosa)
a poesia que há...
a inevitável rosa
(poemeto ao modo de Mário Quintana)
Eurico
08.06.07
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